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O DEMO BURLEIRO

demo, diañu burllón, tardo, trasgo ou trasgu, encanto, home-peixe...


Mito cristianizado que se move de noite pelos campos, trocado às vezes com o tardo. Ente vivo na imaginação dos crentes, que são quem o topam, oferece-se em forma de cavalaria para passar o rio, mas sacode na água aos que sobem.

Cando ibam ver as mozas a esoutra parroquia, a Damil, chegando ó Porto apareceu-lhes uma égua moi bonita, acarinhárona... E ibam a cavalo duma égua..., e no medio do rio desapareceu a égua..., desfixo-se. Nom sei, nunca chegarom molhados... Nesse Porto viam umas luzes, sentiam éguas rinchando...
Cela, Outeiro de Rei





AS XÁCIAS

xanas, xairas, inxanes, xanes, janas ou anjanas, encantos, fadas, donas d'aigua, moras ou mouras, lami, lamiak, lainas ou lumias, ondinas, feiticeiras, velhas, senhoras e princesas...


Seres míticos humanizados do meio aquático emparentados coas sereias são as xácias da Ribeira Sacra. Como as fadas marinhas, cativam aos homens pela sua beleza, para mais tarde causar a perdição dos que as seguem.

E, pescando na beira de dito rio, um vizinho do lugar de Marce viu uma xácia, bela e formosíssima, a qual manifestou ao pescador que, se a baptizava quedaria desencantada, e casaria com ela... E realizou-se o matrimónio... Aborrecida a xácia do seu marido, abandonou, e voltou ao encanto, mas os seus parentes despedaçaram-na nas profundidades do rio..., assim cruelmente tratada pelos demais xácios, por fazer-se cristiá, baptizando-se.
Castro López, Ramón, Reseña histórico descriptiva de la parroquia de Vilar de Ortelle y su comarca, Monforte de Lemos, 1929





O TRASGO

tardo, trasgo ou trasgu, demo, diañu burllón, encanto, home-peixe...


Demo menor que se topa de noite, confundido às vezes com o dianho burleiro (Occidente de Asturies e metade Norte de Lugo), onde levanta pontes e outras obras no meio aquático.

O caneiro do trasgo antes tinha uma boca sola, e cando ibam pescar levavam o cavalo pra insua, e sempre aparecia acarreirando, seria cousa do demo... Botarom-lhe pez ó cavalo, e o demo sentou-se nel e nom se soltava... O demo, pra que o deixaram, ofreceu-lhes fazer outra boca ó caneiro, onde sempre pescariam algo. E fíxo-lhes uma boca torta, que cando a puxerom direita nunca pescou, hasta que a puxerom outra vez torta... O caneiro ali está, coa boca torta, e asi recordo que o contava mi padre...
Ombreiro, Lugo





AS FEITICEIRAS

feiticeiras, velhas, senhoras e princesas, ondinas, encantadas ou encantos, fadas, donas ou donas d'aigua, moras ou mouras, xanas, lami ou lamiñaku, lavandeiras...


Entes dos rios, mui topadas entre Arbo e Melgaço, representam o desejo tentador pelo inexplorado -a riqueza e o prazer, também a fatalidade- em oposição ao controlado -a ordem, mas com a escassez de cada dia-, o pagão antagonista do cristão.

A primeira vez que passavam, sobre todo ós rapaces da montanha, diciamos-lhe:
-Mete uma pedra na boca e nom a quites hasta chegar ó outro lado. Tes que meter un coio senom afunde-se a lancha...

Quelhepam, Ourense





A VELHA

velhas, feiticeiras, encantos, senhoras, mouras, bruxas, demos, fadas, donas...


Há seres míticos que aclaram a origem de feitos maravilhosos, explicam formações geológicas como o Pedregal de Irímia, nascente do Minho, obra duma velha ou dos demos que deixaram cair as pedras que portavam.

Di-se que fora uma velha, que levava o regaço cheo de pedras, e que as deixou caer desde a cima do monte...
Meira





AS COBRAS

serpe, cóbrega, cuélebre, drago, crocodilo, coca ou coquetriz, tarasca, encanto, xerpa ou serpa...


Representação do mal, de tamanho extraordinário, vêm do mar (Monção) ou rodam pelas ribeiras (Ribeira Sacra) e voam quando são velhas. Emparentadas com os encantos e as serpentes que guardam tesouros em covas.

As cobras cando som velhas, claro que volavam... E andavam darredor, mordiam o rabo, enroscavam-se, tiravam-se pola ribeira ou polos montes... Eu nunca as vim, sempre se dixo, contam eso...
Sobrecedo, Tabuada





Os mitos dos antepassados deixam de manifestar-se, morrem com os derradeiros ribeiraos que os topavam, sem procurar um acomodo para eles nas narrações dos mais novos. Resistiram a romanização e o cristianismo: Martinho de Dume (518-525) e Frutuoso de Braga (579-665) reprovam -desde uma leitura romano-cristã- o culto aos demos expulsados dos céus que presidem o mar, rios, fontes e montes (Neptuno, Lámias, Ninfas e Dianas).


Os rios foram lugares de passo, sustento e lazer para a povoação das ribeiras. Espaço para a relação entre os homens, e destes com outros entes com os que compartiam território e disputavam valores morais (reflectem a mentalidade colectiva, explicam e justificam o passado e o presente, e mostram os projectos do futuro). Ao lembrar alguns traços daqueles mundos enlaçados saberemos um pouco mais da nossa herança cultural.



Os mitos dos rios

TEXTO: ASSOCIAÇÃO BARCAS DO MINHO

Barcas do Minho